Acompanhar a carreira de algum cineasta pode ser frustrante ou inspirador. Escolhas, imposições e dificuldades podem acontecer no caminho, mas alguns, quando uma chance lhe é dada e o resultado é positivo, têm as portas abertas para a livre criação. Ryan Coogler (Pantera Negra: Wakanda para Sempre, de 2022) parece ter alcançado esse patamar. Desde sua excepcional estreia com Creed: O Legado de Rocky (2015), Coogler passou a ganhar cada vez mais espaço para criar e contar suas histórias em Hollywood e Pecadores é um fruto desse trabalho.
O novo longa-metragem do diretor e roteirista estadunidense mostra mais do que a maturidade de sua carreira, mas também é um lembrete de onde o cinema pode percorrer com uma narrativa. Surpreendentemente, Ryan Coogler consegue unir um drama racial de época com elementos de terror frenéticos – tudo isso recheado de cenas de ação maravilhosamente coordenadas. Pecadores chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (17) para arrebatar o espectador.
Para quem acompanha a carreira do cineasta, já se esperam discussões aprofundadas sobre racismo e os problemas estruturais enraizados na formação da sociedade nos Estados Unidos – especialmente pelo filme se passar no Sul do país, nos anos 1930. A base histórica já permite Ryan mostrar seu cinema de debate e representação, mas em Pecadores ele decide ir além e brincar ainda mais com as possibilidades narrativas do que foram os horrores de ser uma pessoa negra nesse período. Aqui ele mostra que o cinema de fantasia – seja pelo terror, pela ficção fantástica ou sci-fi – pode ser um ótimo mecanismo discursivo.
Em Pecadores, Coogler assina tanto o roteiro quanto a direção numa proposta que se preocupa em mesclar as dores do passado com ação, mistério, fantasia e horror, tudo isso costurado por um elemento cultural fundamental: a música. A presença do blues como um fio condutor da narrativa é inebriante. É fascinante como o cineasta consegue usar a música como um mito, um personagem e como história. Mais uma vez, Ryan Coogler mostra que uma boa direção tem a ver com visão – e a dele nunca decepciona.
Assista (por sua conta e risco) ao trailer de Pecadores
Com a potência da música como um elemento narrativo, seu parceiro de longa data, o compositor Ludwig Göransson (Pantera Negra, de 2018, e Oppenheimer, de 2023), completa o filme com uma trilha sonora espetacular. A importância da música dentro e fora de Pecadores se expressa como um elemento a parte por ser fundamental na história dos EUA, ainda mais quando se fala do blues e jazz. Então o trabalho de Göransson foi – assim como nos dois longas do Pantera Negra – um estudo sobre a formação, existência e resistência da população negra ao longo da história do país.
Pensando na imagem, para construir esse universo de tensionamentos, Coogler conta com Autumn Durald Arkapaw (A Última Showgirl, de 2024) na fotografia e Hannah Beachler (Moonlight: Sob a Luz do Luar, de 2016) na direção de arte. Tanto o trabalho de Autumn e sua equipe quanto o de Hannah e seu departamento dão ainda mais fôlego para a beleza que é assistir Pecadores. As imagens falam por si só. Os contrastes de cores, o uso da luz e das sombras, a composição de atmosfera a partir dos elementos cênicos captados pela câmera e até mesmo a escolha da mescla entre duas proporções de aspecto diferentes da imagem ajudam a elevar o filme.
O resultado técnico de Pecadores também alcança o patamar necessário para dar força às imagens pensadas por Ryan Coogler graças ao trabalho de montagem de Michael Shawver (Abigail, de 2024). É impressionante a precisão dos cortes e a união das cenas. Existe uma aura sutil do drama que não se perde, mesmo quando dá espaço para a intensidade do horror ou das cenas de ação. A partir da condução de Coogler, a equipe técnica entendeu quando tornar turbulenta a narrativa e quando suavizá-la.

Todo esse resultado se eleva ainda quando se tem em cena um elenco que corresponde às necessidades e expectativas do roteiro e da direção. Quando se tem Michael B. Jordan (Creed 3, de 2023), Hailee Steinfeld (Homem-Aranha Através do Aranhaverso, de 2023), Jack O’Connell (Back to Black, de 2024), Wunmi Mosaku (Loki, de 2021-2023, e Deadpool & Wolverine, de 2024) e Delroy Lindo (Vingança & Castigo, de 2021), o resultado não poderia ser diferente. Suas presenças em cena fazem o público se entregar imediatamente às surpresas que Pecadores guarda.
Além dos veteranos, que já chamam a atenção antes mesmo de nos avassalarem com suas performances, é preciso se falar de Miles Caton. O cantor e compositor estreia nas telonas com o filme de Coogler em uma entrega de tirar o fôlego. Seu personagem em Pecadores é a conexão entre a música como elemento cultural e narrativo e isso permite que Miles mostre tanto o seu talento como cantor quanto como ator.
Com todos esses elementos alinhados e muito bem costurados na produção, Coogler consegue surpreender o público e a crítica por tomar um caminho que ninguém esperava. Sua aposta em utilizar artifícios narrativos e imagéticos do terror para compor as camadas de um drama racial deu muito certo. O sucesso de Pecadores é fruto de uma visão clara sobre que tipo de cinema move o Ryan Coogler – e ele nunca decepciona em colocar a sua essência no que faz.
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