Crítica | Emilia Pérez desliza nos estereótipos e trama perde credibilidade

Crítica | Emilia Pérez desliza nos estereótipos e trama perde credibilidade

Obras que se propõem a desafiar convenções sempre geram debate, e Emilia Pérez não só se mantém à regra, como furou a bolha e vem provocando uma dualidade gigantesca em sua recepção. Sua tentativa de misturar crítica social, musical e drama criminal acaba resultando em um retrato distorcido que não abarca por completo suas próprias complexidades. Embora tenha uma premissa instigante e visualmente marcante, a obra se perde ao tratar temas delicados de forma banal, esbarrando em estereótipos e escolhas narrativas que comprometem sua autenticidade.

A trama gira em torno de Rita (Zoe Saldaña), uma advogada talentosa e insatisfeita que recebe uma proposta inusitada: ajudar um dos chefes do cartel mexicano a desaparecer e renascer como Emilia Pérez (Karla Sofía Gascón). O enredo se desenrola entre intrigas, identidade e poder, explorando o processo de transformação da protagonista e suas consequências.

O grande entrave é que a condução da história não dá o tempo necessário para que certas mudanças se consolidem, tornando algumas reviravoltas abruptas e forçadas. Já no lado positivo, Karla Sofía Gascón é brilhante em transmitir a dor e redenção da personagem, o que logicamente é favorecido pelo paralelo real da história da atriz. Saldaña entrega uma protagonista bem estabelecida e facilmente identificável, enquanto Adriana Paz (interpretando Epifanía) chega no último terço do filme para finalmente trazer alguém realmente mexicano em tela – no núcleo principal.

Veja o trailer de Emilia Pérez:

Um dos principais problemas do filme é a fusão entre seu realismo social e o tom surreal do musical. Enquanto a trilha sonora tenta dar um tom poético e sensível, a estrutura narrativa falha em equilibrar a teatralidade com a profundidade dramática. O resultado é um contraste que enfraquece a experiência, tornando alguns momentos caricatos em vez de impactantes. Selena Gomez, por exemplo, interpreta uma personagem que deveria ser latina, mas sua performance passa a impressão de uma estadunidense que está apenas imitando (de forma bem espetaculosa) uma cidadã nativa do México.

A abordagem dos temas centrais, especialmente a transição de gênero e suas implicações, tinha grande potencial, mas o roteiro trata a questão de forma apressada e, em alguns momentos, simplista. A tentativa de unir reflexão e estética artística forte parece mais uma estratégia para suavizar as falhas na construção dos personagens e da ambientação. Como consequência, alguns elementos que deveriam ser profundos acabam parecendo apenas acessórios estilísticos.

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Mesmo com esses problemas, Emilia Pérez não é um desastre completo. Há méritos na sua ousadia e na tentativa de trazer temas importantes para o cinema mainstream, atingindo mais pessoas. No entanto, a falta de coesão entre sua proposta e sua execução faz com que o filme não alcance o impacto esperado. Além de, claro, a espetacularização de um grande comunitário a partir de uma perspectiva exagerada excessivamente artística. No fim, a experiência deixa a sensação de um projeto ambicioso, mas que se perde na própria excentricidade.

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